No tempo em que as coisas falavam havia duas latas, uma nova e a outra, velha. As duas estavam presas por corda à extremidade de uma vara. Era assim que um velho homem as mantinha e as levava para o rio, onde apanhava água, que era vendida no povoado.
A lata nova costumava falar mal da sua colega. Com as duas suspensas e carregadas pelos ombros, o homem velho ouvia tudo.
E o que dizia a lata nova? Ela falava para o dono que a lata velha já não servia mais para o serviço. Que sua colega estava se enferrujando e apresentava furos. Que, com isso, havia perda de água pelo caminho, desde o momento em que eram cheias, no rio, até chegarem ao povoado. Que a lata velha devia ser jogada fora, substituída por uma nova. Etc. etc.
Um dia, de volta ao rio, o velho homem pediu à lata nova que olhasse as margens do caminho. E a lata nova viu: de um lado, só areia e capim seco; do outro, tudo muito colorido, com grama verde e plantas com flores de todas as cores.
E a lata nova ficou calada, ao perceber que o lado cinzento, estéril, sem vida, ...era o seu lado. Diferentemente, por onde passava a lata velha, havia cor, beleza e vida.
Consumida pelo egoísmo, pela presunção e malquerença, a lata nova não percebia que sua colega mais velha deixava cair água em gotas preciosas, que saíam pelos furos que se formavam ao correr do tempo, com a ferrugem da idade.
Eram aquelas gotas, milhões delas, nas muitas idas e vindas do leva e traz de água, que foram regando a beira do caminho, do lado da lata velha.
O homem velho sabia disso, e gostava disso, pois, ao mesmo tempo que matava a sede das pessoas, ajudava a transformar a secura da estrada de sua vida.
Havia beleza e cor em um lado de seu caminho. Um dia chegaria a vez da lata nova, que também aos poucos iria fazer a sua parte, gotejando vida e transformando para melhor a paisagem do seu dia a dia.
Nem sempre o que é velho é inútil, ou improdutivo. Há um lado bom em todas as coisas -- mesmo que seja uma lata velha.
Peça sabedoria a Deus para enxergar ou saber descobrir esse lado bom.
EDMILSON SANCHES
edmilsonsanches@uol.com.br
(Texto inspirado em fábula popular).
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