A democracia pode ser definida como o regime no qual os governantes são escolhidos pelos governados, por intermédio de eleições livres e honestas. Esse mecanismo de escolha dos governantes deu origem à teoria da representação, mecanismo através do qual o eleitor concede ao eleito um mandato para falar e agir em seu nome.
Originalmente, a representação ocorria apenas nos parlamentos, de onde saem os gabinetes de governo nos regimes parlamentaristas, mecanismo que se estendeu, depois, para o exercício de mandatos no Poder Executivo nos regimes presidencialistas.
A eleição, como doutrina da representação, foi profundamente transformada pelo desenvolvimento dos partidos políticos, antes inexistentes. Na origem da democracia moderna, a eleição de representantes ocorria em assembleias públicas. Os partidos foram surgindo posteriormente, com o agrupamento de representantes nas assembleias. Os grupos de parlamentares que deram origem aos partidos se formavam por identidade de posições em sucessivas votações.
A criação dos partidos introduziu um intermediário entre os eleitores e os eleitos, fato que modificou profundamente a relação entre ambos. Essa mudança reside no fato de que, antes de ser escolhido pelos eleitores, o candidato a um cargo eletivo é escolhido pelo partido. Aos eleitores, portanto, somente cabe ratificar as escolhas anteriores dos partidos.
O eleito, dessa forma, recebe um duplo mandato, do partido e dos eleitores. A importância maior ou menor de cada um dos mandatos varia de país para país, embora predomine a valorização do mandato eleitoral sobre o partidário.
Existem duas formas possíveis de os partidos processarem a escolha de seus candidatos: a “indicação”, através da qual o candidato é designado pelos dirigentes do partido, ou a chamada “eleição primária”, ou “prévia”, através da qual o candidato é escolhido por meio de um pré-escrutínio promovido pelo partido, em geral, de participação restrita a filiados.
No sistema eleitoral norte-americano, o presidente é eleito por um colégio de delegados. Diferentemente do que ocorre no Brasil, nos EUA os eleitores votam em candidatos nas eleições primárias, mas esse voto se converterá na eleição de delegados às convenções partidárias. O presidente dos EUA, portanto, é escolhido entre os candidatos que conquistam a maioria do colégio de delegados, composto por 538 representantes.
O colégio eleitoral é formado a partir de pesos atribuídos especificamente a cada estado, proporcionalmente às cadeiras na Câmara de Representantes e no Senado, de acordo com a população de cada unidade federada.
As eleições para o Poder Legislativo nos EUA também obedecem a uma lógica bem distinta do modelo brasileiro. O sistema eleitoral, nas eleições para as cadeiras na Câmara dos Representantes é o de voto distrital puro. Nesse sistema, o território dos estados é dividido em circunscrições eleitorais (distritos) e os candidatos são eleitos ao obterem a maioria na votação distrital.
As eleições para a Câmara dos Representantes ocorrem de dois em dois anos. Já os senadores têm mandatos de seis anos, com eleições correndo de quatro em quatro anos, com renovação parcial de algumas cadeiras, similar ao que ocorre no Brasil.
A Câmara dos Representantes é composta por 435 deputados, eleitos em quantidade proporcional à população de cada estado. O Senado possui 100 representantes; dois por estado.
Na maioria dos estados (48 de 50), o sistema de eleição de delegados às convenções para eleição presidencial é majoritário, isto é, o candidato que fizer mais votos faz todos os delegados daquela circunscrição. O estado da Califórnia, por exemplo, tem 55 delegados. Os estados do Alaska e Dakota do Norte, por sua vez, têm direito a apenas três delegados. As exceções ao sistema majoritário ocorrem nos estados do Nebraska e Maine.
Nos Estados Unidos há casos, em alguns estados (cada estado dos EUA possui regulamentação específica sobre isso), por exemplo, em que as primárias são abertas aos eleitores e simpatizantes, sem a necessidade de vínculo partidário, caso em que, inclusive, a primária assume as características de uma verdadeira eleição preliminar.
Em ambos os casos, indicação ou eleição primária, há influência dos dirigentes partidários sobre a escolha dos candidatos, variando apenas a dimensão do colégio eleitoral, mais ou menos restrito, que irá designar o(s) escolhido(s) para representar legenda perante o eleitorado em geral.
Outra variação importante que pode ocorrer nesses casos é o caráter aberto ou fechado da escolha. Isto é, a eleição de um candidato pode ocorrer em âmbito interno ao partido, em caráter privado, de modo a preservar a organização e seus candidatos da exposição pública de suas divergências internas; ou pode ser aberta, assumindo caráter oficial e público.
Nos EUA, as primárias assumem a característica de uma verdadeira eleição preliminar, sendo organizadas pelos poderes públicos, como a própria eleição, com a votação inclusive ocorrendo nos mesmos postos eleitorais.
Nos estados de Iowa e Nevada, a escolha dos delegados às convenções partidárias que elegerão o presidente ocorre nos caucus, que são assembleias nas quais se dá a eleição dos representantes. No caucus, o voto pode ser em urna ou aberto, isto é, com o eleitor levantando a mão para manifestar sua vontade.
Nessas reuniões, cada partido político reúne os apoiadores dos candidatos que disputam a primeira rodada de escolha. O número de delegados corresponde à quantidade de residentes na circunscrição eleitoral. Usa-se uma fórmula matemática que determina o número de votos que é preciso obter na eleição primária (caucus). Os delegados, nesses casos, são eleitos por representação proporcional.
Nas primárias fechadas somente podem participar eleitores do próprio partido, sendo que, para participar da eleição primária de um partido, o eleitor precisa se “matricular” nessa legenda através de um mecanismo chamado registration, através do qual a pessoa declara o partido a que pretende se “filiar” para votar na primária, decisão que somente pode ser alterada na próxima registration.
Pode ocorrer ainda a matrícula na entrada do posto eleitoral, onde o eleitor recebe uma cédula do partido que escolheu, sendo que o prazo para modificar a filiação para a primária seguinte pode variar entre um intervalo de seis meses a dez dias, conforme o estado. Há estados em que o acesso à primária é mais restrito, exigindo dos participantes prova de fidelidade através de declarações expressas de apoio (challenge).
Esse mecanismo não deve ser confundido com o procedimento de filiação partidária, que pressupõe um vínculo mais sólido com a organização partidária, incluindo não apenas a participação nas prévias, mas também a contribuição financeira regular, a participação na vida do partido e a influência nas suas decisões e na escolha de seus dirigentes, o que não é exigido dos eleitores e simpatizantes que participam das prévias matriculando-se no partido.
Nas primárias abertas é preservado o segredo das preferências políticas do eleitor, que não é obrigado a explicitar sua inclinação partidária. Nesse caso, o eleitor recebe duas cédulas na entrada do posto eleitoral, uma de cada partido, ou, ainda, uma cédula com duas colunas, contendo a lista dos candidatos de cada legenda, marcando uma cruz ao lado dos nomes que prefere, devendo o eleitor utilizar apenas uma das cédulas, ou deixar em branco a coluna de um dos partidos, sob pena de anulação do voto.
Já a definição da lista dos postulantes à condição de candidatos de um partido ocorre pela coleta de assinaturas de membros da organização partidária, número que varia conforme o tamanho da circunscrição eleitoral. Esse procedimento oferece às minorias partidárias mecanismos de proteção contra grupos dominantes, que de outra forma poderiam impedir o acesso dos grupos minoritários à possibilidade de apresentar pré-candidatos aos eleitores.
Esses mecanismos foram desenvolvidos nos EUA, no princípio do século XX, para reduzir a influência dos dirigentes partidários sobre a escolha dos candidatos, reduzindo o peso da “máquina” sobre esses processos de decisão coletiva. De fato, o mecanismo das eleições primárias implicou a democratização do método de escolha dos candidatos, forçando uma mudança na forma através da qual os dirigentes influenciam esse tipo de decisão nos partidos.
Importante ressaltar que, se por um lado o mecanismo das primárias remete ao eleitor a arbitragem sobre os conflitos e rivalidades internos aos partidos, ele pressupõe a necessidade de que os partidos garantam ampla participação, o que, em caso contrário, restringe muito a significação da escolha através desse tipo de procedimento.
O mecanismo das prévias, portanto, é um expediente que traz muitas contribuições ao aperfeiçoamento da democracia, contribuindo para oxigenar os partidos e conferir maior transparência às decisões tomadas por essas organizações encarregadas de decidir os destinos do povo, seja no governo, seja na oposição.
O debate político que ocorre entre os candidatos que disputam uma eleição primária contribui para o esclarecimento dos eleitores, qualifica o voto e fortalece os partidos com o ingrediente da participação, sem o que, aumenta o foco cada vez maior que vai se constituindo entre a classe política e aqueles a quem ela pretende representar.
Uma eleição presidencial nos EUA, considerando o processo completo, desenvolve-se ao longo de cerca de dezoito meses. Como se pode ver, esse modelo implica intensa mobilização da população em torno de sucessivas rodadas de debate e escolha, muito diferente do modelo brasileiro, em que a campanha é curta e o eleitor é mobilizado em estreito espaço de tempo para escolha direta de seus representantes.
Importante registrar que, pelo sistema majoritário dos EUA, um candidato pode se eleger presidente sem ter recebido a maioria dos votos dos eleitores. Para se eleger presidente, o candidato precisa fazer a maioria dos delegados às convenções partidárias. Foi o que ocorreu com Hillary Clinton e Donald Trump em 2016. Hillary fez a maioria dos votos, mas Trump elegeu-se fazendo a maioria dos delegados.
Finalmente, mais um detalhe: o sistema eleitoral americano permite a votação pelo correio. O voto pelo correio também responde a regras definidas por cada estado. Essa questão está no centro de uma polêmica neste momento, com o presidente Trump questionando essa modalidade de voto, dado considerar que os eleitores republicanos tendem a ser mais mobilizados e, dessa forma, o voto pelo correio favoreceria os democratas. Essa polêmica é meramente eleitoral e não deve alterar a legislação sobre essa modalidade de voto.
Fonte:Revistatercalivre
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